segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Dona Benedita e os pontos de crochê de Brotas



A disputa era desigual, e até mesmo injusta. O sol franzino disputava espaço no céu com um aglomerado de nuvens. Porém, mesmo com o seu intenso calor, a luz solar não conseguiu ultrapassar a grande muralha de nuvens acinzentadas da capital paulista. O que realmente chamava a atenção eram as duas maritacas que dançavam e soavam o som da vida, no meio da poluição da cidade. Foi assim que começou o penúltimo dia da décima segunda edição do Revelando São Paulo. O festival realizado no Parque da Água Branca transformou o lugar no ponto de encontro das culturas tradicionais do estado.
Diversas atrações foram oferecidas, como, comidas típicas, Folia de Reis, bonecos gigantes, violeiros, congadas, romarias, entre outras. O artesanato exibido pelas centenas de cidades apresentadas chamou a minha atenção. Eram brinquedos de madeira, panelas de barro, miniaturas, pinturas, esculturas de cipó e vime, artesões de todos os tipos e gostos.
Fui acompanhado de uma colega, e como toda mulher que se preza, ao ver uma bolsa, pára. De longe ela observou as lindas bolsas feitas de crochê. Ficou atônita quando percebeu o capricho e a qualidade com que aquele produto era feito. Enquanto olhávamos, uma senhora veio nos atender: “Vamos levar uma bolsa hoje, minha querida? Qualquer coisa estou aqui!”, proferiu ela à minha amiga. Aproveitamos, e perguntamos se dava muito trabalho fazer aquelas bolsas. Ela disse que dava sim, mas que era prazeroso. Quando me dei conta já estávamos tendo uma longa conversa. Falamos não só de artesanato, mas também de assuntos, como, política, educação, juventude e valores morais.
Dona Benedita Helena é professora aposentada da rede pública de ensino. Pequena, branca, óculos arredondados, cabelos alvos e curtos, vestia uma camiseta e uma calça preta, destacando a clareza da sua alma. “Até hoje eu trabalho! Não consigo ficar parada. Dirijo e nunca sofri um acidente”, comenta, ostentando um orgulho radiante. Aos sessenta e nove anos, caminha todos os dias e tem uma mãe de noventa e dois anos viva. “Minha mãe ainda me trata como uma criança”, disse. Fica triste ao comentar do descaso dado pelos governantes ao Revelando São Paulo. Segundo ela, no ano passado tentaram acabar com o evento, porém um abaixo assinado realizado, reuniu mais de três mil assinaturas e impediu que isso acontecesse. E ainda complementa dizendo que “não há propaganda desse lindo evento”. Porém a tristeza desaparece de seu rosto ao explicar que foi a escolhida para representar os vários artesões de Brotas.
Perguntei se com artesanato dava para ganhar dinheiro. “O artesão não trabalha por lucro. Não pode fazer contar com o lápis, tem que fazer com amor”, respondeu ela. Quando percebi, já fazia mais de uma hora que estávamos conversando, e ainda tínhamos muito para conhecer. Nos despedimos da dona Benedita, com a certeza de que logo nos encontraríamos. Afinal, além de ter tido uma enriquecedora conversa, conheci e ganhei uma amiga inesquecível.

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